sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Sobre aquela que odiava o amor

AVISOS
1. Esse post, em particular, não é apropriado para menores de 18 anos.
2. Sou nova na arte de descrever atos sexuais, então talvez tenha falado alguma coisa idiota XD 

Foto: Junior Colferai / Ler ouvindo Snuff, Slipknot


"Existe a necessidade absoluta de se sentir desejado e neste círculo do desejo é muito raro que dois desejos se encontrem e se correspondam. O que é uma das grandes tragédias do ser humano" Pedro Almodovar



Acho que nunca percebi o quanto era problemática. Pensava mais nisso como "uma vontade de discordar". Lembro que, quando você me encontrou, eu estava bebendo Coca-Cola zero no bar. Pensei em pedir um copo de leite, mas seria extremo demais, e eu nem gostava de leite. Fiquei com a minha Coca.

Você achou divertido me ver sentada lá, com o canudo e açúcar, meu caderno aberto no balcão, um lápis 6B e pouca inspiração. Achou tão divertido, que se sentou ao meu lado.

Você é o tipo de pessoa que a gente conhece por inteiro só de saber o nome. Thiago dos Anjos. Não sei exatamente que tipo de pessoa se apresenta, em um bar, com o nome inteiro. Talvez fosse proposital, talvez você gostasse de como seu nome soava. Thiago dos Anjos. Meu cérebro correu imediatamente pelos versos decorados de Augusto dos Anjos. Você tinha olhos insanos de frustração.

"Toma um fósforo. Acende teu cigarro! O beijo, amigo, é a véspera do escarro. A mão que afaga é a mesma que apedreja" eu disse, em resposta, antes mesmo de me apresentar. Você deu uma gargalhada, jogando a cabeça para trás.

É nesses momentos, em geral, que a gente sabe que vai ter, tão logo, o poder de salvar ou quebrar o coração de alguém. Eu me limitei a sorrir. Fechei o caderno e rodei o banco em sua direção.

Você trabalhava em assistência de informática, e odiava cada segundo que passava naquela mesa, respondendo às mesmas perguntas. Seus amigos eram ótimos, bebiam e viviam com você, mas não o entendiam. Sua família era, por vezes, um santuário, e por outras, um inferno particular. Tinha um sobrinho a caminho, isso o deixava empolgado. Mas você procurava algo mais, alguém mais. Alguém que entendesse sua falta de euforia pelas coisas cotidianas, sua frustração pela falta de conteúdo humano, seu desejo pelo desconhecido e atração por coisas que, no final, apenas te machucavam. Sem ex-namoradas marcantes, apenas alguns casos sem significância depois das duas da madrugada. Você era, em resumo, um fodido.

Sua profundidade me entediava, embora naquela época eu ainda não assumisse isso em voz alta. Metade de seus problemas eram tão filosóficos que poderiam ser consertados com um simples "cresça". Qualquer garota ali se derreteria com a sua aura de criança triste, mas você escolhera a garota errada. Acho que é esse o grande problema do coração, queremos sempre aquilo que não nos é certo.

Cruzei as pernas, e aquilo teve o efeito esperado. Seus olhos deixaram de encarar os meus, o que já tinha se tornado desconfortável há alguns minutos, e migrou pelo meu corpo. Passou pelos meus cabelos, cujos cachos castanhos escuros estavam meio presos num coque mal feito; vislumbrou meus lábios cheios, sem batom; meus ombros nus, o decote redondo da minha regata branca; minha cintura, minhas coxas cobertas pela calça jeans, e ouso dizer que descansou tempo demais entre minhas pernas, mirando o objetivo mor da noite. Na subida, ainda lambeu os lábios ao passar por meus seios.

Você tinha cara de Thiago. Os cabelos loiros cinzas cortados em estilo militar, pele levemente sardenta, olhos claros, cuja cor não pude distinguir sob a luz amarelada do bar, lábios estreitos, ombros largos, mãos enormes e uma pequena cicatriz no queixo. Alguma engrenagem na minha cabeça tomou aquilo como uma marca de guerra, um sinal de força, de gente que já viveu e sobreviveu. Isso e sua camisa xadrez vermelha e preta nos levou para o banheiro masculino.

Tinhas uma delicadeza que não combinava com nossa situação, uma meia força que podia ser confundida com meia vontade. Parei, recostando-me sobre uma das paredes do reservado, e lancei-lhe um olhar. Várias pessoas conhecem esse olhar, e todas dizem que ele é muito claro em significado. Você não foi exceção. Puxou-me pela cintura, com muito mais força do que eu esperava, desceu as mãos pelas minhas costas, entrando pelo cós da minha calça e meio esfregando e meio apertando minha pele arrepiada.

Abriu minhas pernas sem que eu pudesse pensar duas vezes sobre aquilo e me prensou na parede. Podia sentir o volume sob sua calça crescer. Inclinei a cabeça para trás e soltei um gemido que não fora planejado. Você o tomou como uma deixa. Tirou minha camiseta em poucas puxadas, deixando vergões no meu torço. As minhas mãos trabalhavam em seu cinto.

Eu sabia que você não tinha experiência naquilo, pois ao invés de se preocupar com a minha calça, você procurava desatar meu sutiã, parecia uma criança sedenta por peitos. Eu mesma fiz o trabalho, e você quase urrou de felicidade.

Circulou meu seio com a língua, parecendo hipnotizado. Seu nariz soltava lufadas de ar quente em minha pele, o que me deixava molhada e com pressa. Segurei o topo do reservado com as duas mãos, aumentando a força das pernas em volta de sua cintura, pressionando meu quadril contra o seu.

Antes de voltar à terra, você ainda mordiscou o bico, fazendo com que eu batesse a cabeça e respirasse alta e descompassadamente. E então suas mãos enormes voltaram a trabalhar.

Puxou a calça e a cueca para baixo com uma mão enquanto me invadia com a outra. Logo escorregou para dentro de mim. Era tão largo e desajeitado que eu fiquei sem ar. Prendi os braços em volta de seu pescoço e amparei minha cabeça ali, sentindo a pressão descontinua que você fazia.

Você entrou naquele estado que os caras entram quando fazem sexo bêbados. Sem consciência e famintos. Alternava entre morder a curva do meu ombro e sussurrar "rebola" no meu ouvido. Eu podia até tentar, mas não faria efeito algum. Você investia com força, fundo e rápido, eu batia repetidamente contra a parede e gemia alto. Não conseguia ligar para a ideia de alguém entrar no banheiro e ouvir.

Gozamos quase juntos, cansados e doloridos. Você ainda me deu um beijo doce antes de sairmos. Perguntou se eu queria ir para a sua casa. Eu disse que não. Não sei exatamente o que eu queria fazer, mas envolvia sair andando sozinha pelo escuro, talvez procurar a minha inspiração perdida dentro de algum copo cheio. Dei-te meu telefone (o verdadeiro) antes de ir embora.

Ele vibrou no meu bolso alguns minutos depois. Eu pensei em desligar. Fechar os olhos e continuar a curtir o vento que vinha da água. Aquele píer era o meu lugar preferido em todo o planeta. Era meu lugar da solidão. Mas eu atendi.

Em cinco minutos você também estava ali. E talvez tenha sido algum tipo de masoquismo, porque o tempo todo eu pensava em pular na água e não me mexer até que estivesse morta. E depois disso, é claro, continuar imóvel. Você não sabia nada sobre mim, absolutamente nada. Nem mesmo sabia o meu nome. Imaginei se teria marcado "menina do bar" no celular, ou "transa no banheiro". Resolvi não perguntar.

Você se sentia um menininho indefeso. Alguém que estava prestes à ser derrotado pelas dores da vida. Sentia-se sozinho, desconhecido, desamparado e esquecido. Queria alguém para ajudá-lo a carregar o fardo de ser alguém diferente. Queria ser compreendido, tinha tanto para falar... Eu só queria que você se calasse, só queria que entendesse o quanto idiota era o que dizia, então transamos de novo. Bem ali, a céu aberto. Minhas costas ficaram marcadas com arranhões da madeira por algumas semanas, mas você se calou.

Só então você se lembrou:

"Qual o seu nome?"

"Não acha um pouco tarde para perguntar?" respondi, e tinha certeza que aquilo o deixaria constrangido.

"Certo, foi um erro meu não perguntar antes, não é?" Você disse, e eu imagino que esperava que eu fosse amigável, e então o desculpasse, e dissesse meu nome, minha idade, RG e CPF.

Eu só disse "É".

Você ainda me ligou algumas vezes depois daquilo. Certos dias só queria conversar sobre seus problemas. Outros queria me encontrar, transávamos em todos os lugares e posições. Deixei que fizesse coisas que nunca pensara em fazer antes. E então você disse que me amava.

"Como pode me amar sem nem saber meu nome!" Uma onda imediata de tontura e náusea se espalhou pelo meu corpo. Até minha visão se anuviara. "Você não sabe o meu nome" Eu dizia pausadamente, mas com mais histeria do que gostava de admitir.

"O que é que há, pois, num nome? Aquilo a que chamamos rosa, mesmo com outro nome, cheiraria igualmente bem" Acho que tentava ser romântico. O que existe de mais romântico do que Shakespeare? E eu podia jurar que sentia meus olhos queimando e minha garganta ficando apertada. Não queria pensar em chorar. Se pensasse em chorar, estaria chorando. Como explicaria isso para ele?

"As juras mais fortes consomem-se no fogo da paixão como a mais simples palha" Eu rebati e, na hora, me pareceu uma boa ideia. Mas, como disse, Shakespeare tem o dom de ser romântico.

"É isso que teme? Acho que já é tarde para temer ser consumido pela paixão. Eu sei que já nos consumimos mutuamente muitas vezes para temer o fogo" Você olhava nos meus olhos, daquele jeito que eu odiava, como se quisesse conhecer minha alma. Eu juro que transaria com você ali, de novo, apenas para que parasse.

"Eu não tenho medo de nada" Eu balbuciei, mas acho que minha voz parecia engasgada.

"Você tem medo de deixar que alguém se torne importante em sua vida, e então você terá algo a perder. Você tem medo de se machucar".

Talvez eu estivesse bêbada, ou apenas cansada. Eu me encostei-me à pilastra mais próxima daquela praça. Acho que era por volta das três da manhã. Abaixei a cabeça e levei as mãos ao rosto.

"Eu prometo que nunca vou te machucar" Você seu melhor para me confortar, e deve ter achado que conseguiu, porque eu parei de soluçar. Acalmei-me e, quando levantei o rosto, dei um sorriso de leve.

"Meu nome é Julia" e eu podia jurar que você choraria de felicidade, se não achasse que eu reviraria os olhos.

Um tempo depois disso eu mudei de telefone. Você nunca me buscou em casa, então não sabia o caminho. Talvez tenha procurado por uma Julia no bar, mas eu também nunca te disse que meu nome verdadeiro era Laila. Eu não sei como você reagiu. E acho que não quero saber.

A verdade é que meu medo nunca foi perder alguém, ou ser abandonada. Eu não saberia explicar bem nem que quisesse, mas o amor e a morte são tão semelhantes em minha cabeça que eu poderia levar alguém a loucura. Eu poderia levar eu mesma à loucura. Eu odeio a sensação. Eu odeio as etapas e eu odeio a proximidade. Nada me machuca mais do que a proximidade, e o modo como isso desgasta o carinho. A verdade é que o amor estraga tudo. O amor é uma onda podre que vem do submundo para me atormentar. Eu odeio o amor. E eu o odeio, porque você me amou.

8 comentários:

  1. Almodóvar está certicissímo e seu conto ilustra muito bem tudo o que acontece todas as noites...

    Tudo é tão gasto. Frágil.
    Ando tanto com a palavra "frágil" na cabeça.

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  2. Amei o texto.
    Amei a forma como se narra a indiferença dela. A forma como ela o vê. Os diálogos.
    A descrição do sexo foi realmente boa.
    Maravilhoso!

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    1. HAUAHA. Que bom, eu tenho medo de ser exagerada ou detalhista demais ao descrever as cenas de sexo. E fico me atrapalhando com as palavras, nunca sei se escrevo "nádegas" ou "bunda", entre outros XD

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  3. O amor tem seus problemas, suas fazes, seus poréns, e para pessoas como a Victoria, kk não faz mais sentido, por que afinal de contas o amor sempre ai rimar com dor.

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