foto de Rachel Dowda |
Ler ouvindo: Counting Stars, OneRepublic
“Você percebe que você meio que
recriou a sua primeira vez com ele?”
Eu olhei fixamente para ela, não sei
se meus olhos diziam que sim ou que não. Não sei se eu pensava que sim ou que
não. Só sei que eu já tinha pensado em algo similar. Tinha pensado em esquecer
a primeira vez, em considerar ele o meu primeiro.
Não porque a primeira vez tivesse
sido tão traumática e paralizante. Por mais que ela me diga que eu precise
entender quando for invadida, eu ainda acho que ganhei o que busquei. Eu
busquei um idiota que leva uma garota para o motel sem saber o nome dela. E
que, depois que ela confessa ser virgem, termina o trabalho mesmo assim. Sem
cuidado, sem carinho, sem vontade.
E o ato todo se finaliza numa grande
chupada no chuveiro.
Parte de mim chora pela falta dos
“primeiros”. O primeiro beijo apaixonante. Um com significado e afeto. Um que
não seja produto de puxada de cabelo na balada.
Quase eu inteira queria uma primeira
vez, se não perfeita, imperfeitamente poética. Por isso pensei em considerá-lo
meu primeiro. Ele foi, em todos os sentidos, imperfeitamente poético, do jeito
que eu gosto. Do jeito que eu preciso.
Mas eu penso por um segundo em
cicatrizes. Aquelas finas e claras, que a gente só vê quando para e presta
atenção. Uma redonda, na parte de dentro do meu braço, que me lembra das coisas
que eu perdi. Duas no meu rosto, que me lembram de não coçar a catapora. Uma no
meu pulso, que me lembra de não ignorar a dor. Uma no joelho esquerdo, que me
lembra de não ter pressa. E a primeira vez, que me lembra de não me deixar
invadir.
Tem uma amiga minha que odeia a
cicatriz dela, uma bem na mão, uma marca de queimadura. Eu digo para ela que é
parte da história dela. Digo que é linda, que é significativa e que não pode
ser escondida por uma pomada qualquer que faz a pele cicatrizar. Não, porque
você viveu aquele machucado e você sentiu aquilo. Eu vivi a minha ridícula
primeira vez e eu me submeti àquela experiência. Eu tinha medo e eu agi com
medo. Medo de nunca experienciar o que era ser desejada, medo de nunca conhecer
o toque de um homem. Medos.
E eu odeio agir com medo. Se tem uma
coisa que me orgulho agora é da minha coragem. É de não ser paralizada por
nada. É de ter reunido todos as minhas fibras de força e ter sido sincera.
Por isso, uso minha pequena cicatriz
da primeira vez como uma tatuagem. Com ela, eu não tenho um caso de amor, como
tenho com meu lobo, com meu sigil e com meu “like crazy”. Ela é o meu aviso.
Ela me mostra que uma simples dose de respeito faz toda a diferença.
Respeito. Eu demorei pra pensar nessa
palavra.
Demorei?
Demorei exatos três minutos olhando
para ele para me decidir. Peguei sua mão e puxei-o para o corredor. Não sabia
se ele tinha medo, vergonha, falta de vontade ou simplesmente se precisava de
privacidade. Só sabia que no corredor as coisas seriam simples, fáceis, claras.
E elas foram.
Eu lembro de detalhes. De todos os
detalhes. Lembro do sorriso dele, como quem diz “Ok, estou sem graça” e de sua
rendição, abrindo os braços e me beijando de um jeito que eu só consigo definir
com “com o corpo todo”.
Ele beija com o corpo todo. E era o
nosso primeiro beijo.
Meu primeiro algo, veja bem.
Lembro da porta fechando, dos olhares
perdidos e dele percebendo meu nervosismo. Do “relaaaxa” dele, que ele diz pra
quase tudo, até hoje. Lembro dele tomando o controle.
Eu sempre achei que não gostasse de
sexo oral. Eu nunca tinha tentado. Nunca tinham tentado em mim, pelo menos.
Talvez por eu ser tão consciente com o meu próprio corpo, talvez por eu
detestar tanto as minhas formas. Mas ele não pediu permissão, ele não perguntou
se eu queria. Ele também não me invadiu. Ele apenas... Me descobriu.
Outra primeira vez.
Me pego pensando naquele dia 13 e
vejo várias primeiras vezes. Várias “matações de vontade”, vários momentos que
foram para mim, ele sabendo disso ou não. Ele entendendo isso ou não.
Por isso, quando ela me diz que eu
recriei a primeira vez, entendo o que quer dizer. E considero. E penso, penso,
penso. Como se de um pensamento algo como uma conclusão útil e bem formulada
pudesse sair e resolver todos os meus maus entendidos.
Mas retruco, tardiamente, aqui,
deitada na mesma cama em que tudo aconteceu, lembrando das mãos deliciosamente
grandes dele na minha pele e do beijo de corpo todo dele, que eu não refiz
nada. O que eu fiz foi começar a porra do capítulo 2.
E que das segundas vezes... Bem,
delas eu tenho um puta de um orgulho.
As minhas segundas vezes foram sempre oportunidades para recriar as primeiras vezes.
ResponderExcluirGisleia
E eu digo de primeira, de segunda e inúmeras vezes: SOU SUA FÃ.
ResponderExcluirIncrível mais uma vez, uma escritora excepcional.
Grande beijo. <3
As lembranças são difíceis de apagar - esquecimento é pura ilusão. Mas a gente também pode se autoenganar com as repetições de vezes primárias. Ou agarrar as segundas e terceiras ocasiões sem pestanejar. Afinal, é apenas um ritual. E, como todo ritual, está "de passagem".
ResponderExcluirAbraços.
Gostei de ler isso. Muito verdadeiro (espero que seja). Bom dia. Adoro essa música do One Republic!
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