quinta-feira, 16 de março de 2017

Sobre CMs

Explicando para a minha mãe o que eu faço
(ou: fazendo as pazes com os demônios da vida profissional)

Mãe,

Lembra a última vez que tentei te explicar o meu trabalho? Chegamos a um resumo pouco competente: “escrevo umas coisas”.
Acho que está na hora de tentar de novo.


Como você sabe, eu sou formada em Jornalismo. Num passado distante eu queria ser repórter de jornal impresso, noticiar guerra e o fim do mundo. Ganhar um Pulitzer por alguma matéria irônica de tema (aparentemente) pouco relevante, como “As 23 funções do apontador de lápis”.

Esse tempo se foi.

Como muitos dos meus colegas de faculdade, eu migrei para a área de publicidade. Posso justificar essa tendência (ou escolha) de muitas formas, mas no meu caso, o motivo foi simples: criar, ao invés de reportar.

Digamos que aquele estágio no jornal e o fato de que passei um mês inteiro fazendo nota de anunciante em formato de matéria noticiosa ajudou na decisão. E aqui estou.

Publicidade, como qualquer outra área, é um grande universo com galáxias e planetas menores – ou, diversas áreas de atuação. As que importam nessa conversa são “digital” e “off”.

Se analisarmos seu consumo de informação, acredito que, de primeira, ao pensar em publicidade, venha na cabeça uma propaganda de TV. Isso é o que chamamos de off (de offline, fora da internet).

Sou da galera do digital. Nossa galáxia é a internet e o nosso planeta, a social media (xoxo midia, para os íntimos). Compreenda aqui a social media como ambientes nos quais informamos e somos informados por pessoas conectadas – como o Facebook, o Twitter, ou o Pinterest, que você tanto ama.

Essa foi a parte simples da explicação. Agora vamos para a complicada.



Todo o tipo de comunicação (profissional) exige planejamento, produção, execução e avaliação (de resultados). E é exatamente isso que fazemos, numa agência.

Eu sou uma CM, ou Community Manager. Gerente de comunidade, em português. Fico inserida na parte de execução, em teoria. Mas a prática (como acontece com tudo no mundo) é um pouco diferente.

Pra começo de conversa, CM é um cargo “variável”, de agência para agência. De forma geral, o CM é responsável por (dã) gerenciar o conteúdo veiculado em uma comunidade (aqui pensamos em comunidade como o universo na qual uma marca está inserida, ou seja, seus canais – como o perfil do Instagram, por exemplo) e talvez a própria definição “solta” seja responsável pela despadronagem desse trabalho.

Veja bem, se pensado através de uma visão limitada, o CM pode ser simplesmente o “cara do telemarketing” (como você tão gentilmente sugeriu, naquele Natal em que tive que fazer plantão), que atende às mensagens dos clientes bravos, com uma resposta pronta, copiada e colada de uma planilha.

Com um pouco mais de inteligência, o CM vira um termômetro da qualidade e acertabilidade do conteúdo que publicamos. Sabe quando uma marca de cerveja faz uma propaganda vergonhosa e as pessoas “caem em cima” no Facebook? Quem acompanha e mede essa repercussão é o CM. No fim, a transformamos em learning (we sure love our english) para que, com a graça da deusa, o mico não volte a acontecer.

Em algumas agências, o CM exerce a gerência da comunidade fazendo o planejamento de conteúdo. Em outras, criando o conteúdo. Em outras, focando em SAC 2.0. Mas a luta “do cargo” é provar que somos uma posição estratégica, e não apertadores de botão.

Sabe por que isso é tão difícil? Somos os vira-latas, basicamente. Muito do que a gente faz é trabalho mecânico. Ganhamos menos do que o resto das pessoas e nem sempre sobra energia para agir e nos inserir de forma estratégica. No fim, já vi isso virar munição na mão de lideranças do mal.

Sim, munição. Já vi CM ser utilizado de forma punitiva (“Você vai fazer CM no recesso e não quero ouvir reclamação”, “Todos os redatores vão fazer CM também, daqui pra frente, se quiserem continuar com a gente”, “Eu vi você mexendo no Pinterest. Vou dar CM pra você fazer, se tem tanto tempo livre”, “Manda o estagiário fazer CM”) e, inclusive, gente muito competente pegar asco do cargo pela forma que lhe era empurrado pela goela.

Mas eu sei que você adora ouvir a parte boa das coisas, então lá vai: nesse quase um ano no cargo, eu vi mudanças legais acontecerem. Se na agência antiga a minha vontade de fazer mais era vista como afronta, nessa casou com a loucurinha dos líderes. Aos poucos nosso departamento se aproximou dos demais, deixamos de ser uma ilha. Ao invés de ficarmos exclusivamente na execução, ganhamos voz de planejamento e, no fim de cada projeto, mostramos pra galera os erros e acertos do conteúdo produzido.

Estamos lutando para transformar as duplas (redação + diretor de arte) em trios (redação, diretor de arte e CM) e, embora isso nem sempre seja possível, a movimentação tem sido positiva.

Sabe aquela historinha dos órgãos (se um para, todos param)? Acho que é bem isso. Eu entrei na vida de CM achando que meu cérebro iria definhar e morrer de tédio depois da terceira semana copiando resposta do FAQ. E descobri que é possível viver a comunicação como uma caixa de areia – e fazer dela um universo maior.

Depois de tanto falar, o que eu faço é ainda mais análogo e menos claro para você, não é? Mas para ser sincera, acho que escrevi esse texto para mostrar pra Ju do começo de 2016 que ela fez o que podia. E que ela cresceu muito desde então.

Beijos,
Ju.






















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